O deputado Odair Cunha (PT-MG), relator da CPI do Cachoeira, mesmo sendo um petista — e essa escolha implica certas obrigações de caráter, digamos, religioso, como jamais contestar “O Profeta” e os aiatolulas que falam em seu nome —, até que tentou, inicialmente, se portar com decoro. Foi pescado pelo governo Dilma para ser relator de uma CPI que o PT queria que fosse da vingança: contra a oposição, contra o Ministério Público Federal, contra o STF, contra a oposição, contra a imprensa…
Bastaram
os primeiros movimentos, e ficou claro que Carlinhos Cachoeira era
apenas o Carlinhos Cachoeira de Goiás, a, vamos dizer assim, sucursal
menos rentável de um esquema gigantesco. Ele era só um operador menor.
Quem seria, por exemplo, o Carlinhos Cachoeira do Rio de Janeiro? Quem
seria o Carlinhos Cachoeira dentro do governo federal? Sim, estava e
está patente: o nome do grande esquema criminoso é Delta, com seu
impressionante laranjal.
O furor
investigativo diminuiu muito, não custa lembrar, quando vieram a público
as folias físicas e metafísicas da “Turma do Lenço” de Paris, vocês
devem lembrar. As cenas do governador Sérgio Cabral dançando “Na
Boquinha da Garrafa” com Fernando Cavendish entrarão para a história de
quem decidir contar a história a sério. Quase todo mundo passou a olhar
para o outro lado, inclusive setores consideráveis da imprensa.
Não custa
lembrar: um senador da República foi cassado, E MUITO BEM CASSADO!!!,
porque flagrado criando facilidades a um contraventor, mas um alto
executivo do Dnit, Luiz Antonio Pagot, afirmou com todas as letras que,
no cargo, atuou para fazer caixa para a campanha de Dilma Rousseff em
2010. E ficou tudo por isso mesmo.
Em suma: a
CPI que o PT criou para melar o processo do mensalão, para “pegar” a
imprensa, o STF, o procurador-geral e ministros do STF (e valia tudo
para isso, muito especialmente a mentira) começava a acumular explosivos
nos subterrâneos do Palácio do Planalto. Então foi preciso mudar o rumo
da prosa.
Aqueles
fiozinho de independência que Cunha parecia ter de início desapareceu, e
ele se tornou mero esbirro da máquina de sujar reputações. O PT, como
sabem, é assim: oferece a sua lavanderia de biografias para tipos como
José Sarney e Fernando Collor e acusa Cristo de charlatanismo se isso,
num dado momento, lhe parecer conveniente.
O
resultado é este que se vê: tudo devidamente pesado, a coisa para eles
está de bom tamanho considerando o que ficou escondido na Caixa de
Pandora: um senador da oposição foi para o brejo, um governador tucano
saiu lanhado, e a Al Qaeda eletrônica aproveitou para satanizar um pouco
mais a imprensa independente. Não conseguiram o objetivo principal,
aquele prometido por Lula, que era sacudir a República e interferir no
placar do STF no julgamento do mensalão. Mas até isso ficou em segundo
plano quando se descobriu o potencial explosivo do esquema Delta — a
empresa segue sendo a terceira que mais recebe do PAC.
O fim da
CPI é mais do que melancólico. Trata-se do triunfo escancarado da
impunidade, ao menos no ambiente do Congresso. A comissão não podia, por
si, punir ninguém, mas lhe cabia dizer o que, por ali, se considera
inaceitável. E tudo, como se nota, parece… aceitável. O que se reuniu, e
é muito pouco, vai para o Ministério Público.
Note-se,
adicionalmente, que as instituições saem um pouco mais rebaixadas —
escrevi nesta manhã sobre a lenta e contínua deterioração institucional.
Pela primeira vez na história, a maioria decidiu fazer uma CPI para
perseguir a minoria, o que já é um assombro. Instalada a comissão, essa
mesma maioria começou, involuntariamente, a produzir fatos contra si
mesma. Então decidiu dar um golpe dentro do golpe, selecionando alguns
alvos no relatório final. A iniciativa soou tão escandalosa que não
prosperou.
A Odair
Cunha não restou outra alternativa que não o vexame do relatório nenhum.
Eis o PT contribuindo para um Brasil mais justo, mais sóbrio e mais
digno.