Luis Felipe Pondé
Sou professor e gosto de dar aulas, coisa rara na
área. Na maioria dos casos, professores de universidade (ou não) são pessoas
que, além de não gostar dos alunos, têm uma inteligência mediana e foram,
quando jovens, alunos medíocres, que fizeram ciências humanas porque sempre foi
fácil entrar na faculdade em cursos de ciências humanas. Claro que quase todos
pensavam em si mesmos como Marx ou Freud ainda não revelados. Ao final, o que
se revela com mais frequência é alguém fracassado que ganha mal e odeia os
alunos. Professores normalmente não gostam de ler ou de estudar, mas dizem que
esse pecado é apenas dos alunos. Há um enorme sofrimento na maioria dos
professores porque têm de fingir o tempo todo que acreditam na importância do
que fazem. A maioria sucumbe.
Se
adicionarmos uma pitada de insegurança à própria capacidade intelectual
(refiro-me a uma insegurança maior do que aquela que todos nós temos em alguma
medida), teremos o perfil da maior parte dos “funcionários da educação, da
arte, da cultura e do intelecto”, e não só dos professores. Tal insegurança
associada à quase absoluta falta de originalidade (as quais normalmente vêm
juntas) explica em grande parte a razão de o politicamente correto encontrar
entre esses “funcionários” seu lar ideal. Claro, afora a covardia, sempre
necessária para você se transformar em alguém que persegue os outros que pensa
diferente de você ou porque é melhor do que você. Nada é mais temido por um
covarde do que a liberdade de pensamento. Toda forma de totalitarismo (o politicamente
correto é uma forma de totalitarismo, e essa forma está presente na palavra
“correto”) sobrevive graças às hordas de inseguros, medíocres e covardes que
povoam a educação e o mundo da cultura e da arte.
Na escola,
a mediocridade vem regada à busca de novas teorias pedagógicas (normalmente com
baixíssimo impacto); na universidade, vem vestida de burocracia da
produtividade e corporativismo de bando; na arte, nos discursos contemporâneos
sobre a “destruição da forma”. Modos distintos de “fazer nada” ocupando tempo e
gerando institucionalização e papo-furado cheio de jargão técnico. Mas ela não
para aí. Engana-se quem supõe que a mediocridade não se reproduz de várias
formas apenas porque aparentemente a espécie não teria sobrevivido se fosse
apenas de covardes. Digo isso por dois argumentos. O primeiro porque os
medíocres são maioria, e isso pode ser indicativo de que a covardia foi
adaptativa em grande medida. O segundo
porque as baratas parecem ser bem adaptadas ao mundo e são maioria absoluta,
como já suspeitava Kafka.
A suspeita
de que a mediocridade reina entre os funcionários da educação e do intelecto
aparece, por exemplo, na obra de dois grandes intelectuais do século 20, o
crítico canadense Northrop Frye e o historiador
do pensamento conservador americano Russel Kirk.
Frye afirma
na introdução do seu monumental Código
dos Códigos, seu livro sobre a Bíblia como grande Matriz da literatura
ocidental, que a universidade é tomada por pessoas de personalidade insegura e
medíocre que se escondem atrás de teorias consagradas a fim de garantir seu
espaço “intelectual” nas instituições do conhecimento. Não apenas as
universidade, mas também a mídia é povoada por pessoas que afirmam que a
maioria quer ouvir, porque isso garante adesões e reduz riscos de confronto. O
politicamente correto é um caso típico de opção, por gerar adesões a um discurso
autoritário. Basta analisarmos grande parte do que se fala na academia e na
mídia para perceber o quanto se repete o mesmo papinho “do bem” que está longe
de descrever a realidade, quase sempre intratável ao “Bem”.
Para pegar
um exemplo da mídia, basta pensarmos em figuras como o atual presidente dos Estados
Unidos, Obama, e o ex-presidente do mesmo país, Jimmy Carter (ambos claramente
incompetentes em assuntos domésticos e internacionais e “líderes para
mulherzinhas”), para ter exemplos claros do que é dizer coisas legais para
receber as palmas de jovens e feministas. Ambos são gente “muito esperançosa”
que mais atrapalha do que ajuda, na medida em que desconhece as realidades à
sua volta. A incapacidade, por exemplo, de ambos entenderem o Oriente Médio é
sofrível. A mídia muitas vezes parece uma reunião de centro acadêmico de ciências
sociais na forma de simplificar o mundo ao nível de uma menina de 12 anos.
Já Russel
Kirk, historiador do pensamento conservador anglo-saxão, nos anos 50 percebia
que a universidade corria o risco de virar espaço onde gente “sem posses” busca
ascensão social. O que aconteceu. Aqui o que importa não é tanto o “número” de
propriedades que alguém tem em seu nome, mas a atitude de “bancário” ou “burocrata”
para com a vida universitária. Sujeito “sem posses”, como descreve Kirk, são
pessoas que se apropriam da máquina institucional da universidade a fim de
garantir seu (e de seus amigos) futuro salarial. O “sem posse” aqui implica
antes de tudo a ausência de posse intelectual enquanto tal. Kafka diria: cara
de rato, alma de barata. Um funcionário como esse teme antes de tudo a
inteligência, por isso age de modo violento quando a percebe, muitas vezes em
nome do “coletivo” e da burocracia. Desconfio de todo mundo que usa a palavra “coletivo”
numa reunião de professores.
Juntado os
dois argumentos, chegamos à mediocridade enturmada que caracteriza a vida
intelectual e acadêmica. Nada há de se esperar da universidade. As ciências duras
ainda podem entregar remédios e robots,
as ciências humanas não têm nada para entregar. Quando algo de importante nelas
acontece, é à revelia das instituições que as sediam. Todos estão quase sempre
ocupados com seus miseráveis salários, mas dizem que não. O cotidiano é, assim,
corroído pelo esforço do autoengano e da hipocrisia.