Uma a uma, as "respostas" que o governo federal procurou
dar aos protestos de junho perderam com muita rapidez o prazo de
validade: os cinco pactos, a constituinte exclusiva, o inexequível
plebiscito sobre reforma política para valer em 2014 e o intempestivo
lançamento do programa para "importar" médicos estrangeiros sem
revalidação dos diplomas com acréscimo de dois anos na formação dos
brasileiros com dedicação compulsória ao Sistema Único de Saúde.
Todas se mostraram inviáveis na prática e obrigaram o governo a dar o
dito pelo não dito. Uma leitura generosa atribui os recuos à premência
decorrente do susto geral que atingiu governantes de todas as esferas.
Uma avaliação realista, porém, mostra que o vaivém é uma constante no
governo federal desde o primeiro ano de mandato da presidente Dilma
Rousseff. Não há, portanto, nada de novo no front. O improviso não
decorre das manifestações, mas de um modo de governar que antecede aos
protestos.
Uma pesquisa rápida mostra exemplos de decisões apressadas que, na
definição de Chico Otávio e Gérson Camarotti em reportagem de O Globo de
julho de 2011, tornaram-se "não-decisões" devido a medidas anunciadas
sem negociação ou consulta prévias ao Congresso e/ou à sociedade.
Exatamente como aconteceu recentemente com os profissionais de Saúde,
com os partidos (em especial o PMDB) aliados e com os governadores.
São elas: a promessa de liberação de emendas de 2009 no valor de R$
4,6 bilhões (suspensa depois pelo ministro da Fazenda), o cancelamento
do chamado kit homofobia devido à pressão dos grupos evangélicos
liderados pela bancada no Congresso e o caso do sigilo de documentos
oficiais, que fez Dilma mudar de opinião sobre o prazo de divulgação
para ceder aos reclamos dos ex-presidentes Fernando Collor e José Sarney
e depois voltar atrás, alertada pelo Itamaraty.
O roteiro de improvisos decorrentes de precipitações não é um
acidente de percurso. É, antes, condição inerente a um governo sem rumo.
Palavrório. O PT levou mais de dez dias para chegar a
um acordo sobre o texto do documento que resultou da reunião do
diretório nacional para analisar "o quadro".
Fez um ensaio de proposta de retorno à esquerda e revisão das
alianças com os conservadores. Recuou e, no fim, concluiu o seguinte: "A
condução de uma nova etapa do projeto exige ratificações na linha
política do PT e do governo que se reflitam na atualização do programa e
na consolidação da estratégia que expressa a radicalização da
democracia".
Considerando a inexistência de pistas sobre a "nova etapa", tendo em
vista a ausência da lista das "ratificações" necessárias, levando em
conta a falta de referência aos pontos de "atualização do programa" e de
que forma isso se expressaria na "radicalização da democracia", o que
se tem é uma linha de raciocínio ligando o nada a coisa alguma.
Faz de conta. Se o governo acredita mesmo que as
emendas ao Orçamento não são instrumento de barganha, mas uma via pela
qual os parlamentares levam "benefícios à população", como diz o
secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, ficam dúvidas.
Por que essas verbas são as primeiras a serem retidas pelo Executivo
que só as libera quando a coisa aperta no Legislativo? E mais: por que
em geral essa liberação não passa da promessa, esquecida depois que o
clima ameniza?
Partindo-se da premissa de Carvalho pode se chegar à conclusão de que
o governo tem deliberadamente negado dinheiro para financiar
"benefícios à população". Trata-se, porém, de um sofisma. Mas é ao que
se presta o argumento artificial do ministro para dourar a pílula do
toma lá dá cá.