Vocês chegaram tarde, meus caros revolucionários. Se o bolso dói, é porque o estrago já é grande
GUILHERME FIUZA
O melhor diagnóstico até agora sobre as manifestações de rua veio do
ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência. Ele
disse que as revoltas são estaduais e municipais. Não deixa de ser um
alívio. Quem quiser ficar a salvo da confusão, já sabe: refugie-se no
Brasil federal. Nada de ficar vagando pelo Brasil estadual e municipal,
porque esse anda muito perigoso, cheio de gente insatisfeita e nervosa.
No Brasil federal não, está tudo tranquilo.
Por sorte, Dilma Rousseff também está no Brasil federal, portanto a
salvo do tumulto. Desse lugar calmo, sem culpa, ela disse que o que os
manifestantes querem é o que o governo quer. São praticamente almas
gêmeas. “Meu governo está ouvindo essas vozes pela mudança. Está
empenhado e comprometido com a transformação social”, informou Dilma.
Disse que passeata é uma coisa normal, que ela mesma já fez muito.
Parecia prestes a botar uma mochila nas costas e ir para a Avenida
Paulista fazer a transformação social.
E mostrou sua visão de estadista: “Esta mensagem direta das ruas
contempla o valor intrínseco da democracia”. Às vezes, Dilma exagera na
erudição. Vai acabar deixando Luís de Camões encabulado. Ela já
explicara que o combate à inflação é “um valor em si”, demonstrando
conhecimento profundo sobre as coisas da vida e seus valores
intrínsecos. “Esta mensagem direta das ruas é de repúdio à corrupção e
ao uso indevido de dinheiro público”, afirmou Dilma, praticamente uma
porta-voz dos revoltosos contra tudo isso que aí está.
Olhando para o circo, só há uma conclusão possível: os revoltosos – os
do passe livre, os dos 20 centavos, os do Ocupem Wall Street sucursal
brasuca, os do turismo cívico e os do civismo vândalo – merecem Dilma.
Repetindo: os revoltosos merecem Dilma. Mais que isso: são cúmplices
dela, pois estavam sentadinhos em casa, enquanto a grande líder mulher
brasileira perpetrava suas obras completas de explosão das finanças
públicas – a céu aberto, para quem quisesse ver. Agora a inflação dói no
bolso? Tarde demais, meus queridos justiceiros.
Essa “presidenta”, que vive lá na calmaria do Brasil federal com seus
40 ministérios (contando o do marketing, de João Santana, o único
essencial), presidiu, entre outras festas, a distribuição de dinheiro
público para o milagre da multiplicação de estádios da Copa. Em São
Paulo, numa jogada comandada por Lula e seus amigos empreiteiros (que
ele representa no exterior), o histórico Morumbi foi mandado para
escanteio. Em seu lugar, surgiu o Itaquerão, novinho em folha, presente
do ex-presidente ao seu clube do coração. Um mimo de R$ 1 bilhão. Sabem
de onde vem esse dinheiro, bravos manifestantes?
Exato: dos vossos bolsos. E onde estavam vocês quando nos esgoelávamos,
aqui da imprensa, sobre essa gastança populista, protegida por índices
lunáticos de aprovação da “presidenta”, e avisávamos que a conta
chegaria? Vocês não leem jornal?
Onde estavam vocês, quando a CPI do Cachoeira – com revelações da
imprensa – estourou o esquema da Delta, empreiteira campeã de obras
superfaturadas do PAC? Vocês sabiam que mais esse ralo de dinheiro
público do governo popular ficou impune porque a CPI foi asfixiada por
Dilma e sua turma? Por que vocês não saíram às ruas para gritar contra
esse golpe?
Onde estavam vocês quando a “faxineira” asfixiou a CPI do Dnit e a
investigação do maior foco parasitário de um governo que – no seu
primeiro ano! – teve de demitir sete ministros suspeitos? Vocês não
desconfiaram de nada? Vocês não leram que o dinheiro de vocês escoava
para ONGs de fachada em convênios fantasmas? Vocês não viram essa praga,
espalhada por vários ministérios do governo popular, apesar de a
imprensa esfregar o escândalo na cara do Brasil? Vocês não notaram que a
tecnologia do mensalão, a privatização partidária do dinheiro público,
nunca saiu de cena, de Dirceu a Rosemary?
Vocês chegaram tarde, meus caros revolucionários. Quando o bolso dói, é
porque o estrago nas contas públicas já é grande. Bem, antes tarde do
que nunca. Mas prestem atenção: entendam logo o que vocês estão fazendo
nas ruas, senão suas passeatas em breve estarão no mesmo museu dos
escândalos que vocês não viram