segunda-feira, 2 de junho de 2014

Porque as cidades pequenas não saem do atraso



Em entrevista, Edward Glaeser professor de Harvard afirmou: “Ao contrário do que se deixam levar por uma visão romanceada da vida longe das zonas urbanas, sob diversos aspectos essenciais para a existência humana, não há lugar melhor para viver do que em uma grande cidade. Pois é justamente em ambientes de enormes aglomerações que os mais variados talentos podem conviver e aprender entre si, potencializando  ao máximo sua capacidade criativa e inovadora. Aumentam assim, exponencialmente, as chances de ascender, ganhar mais e ter acesso ao que há de mais avançado. Nos formigueiros humanos é que está a riqueza.”
Sem discutir o mérito dessas afirmações, há aqueles que consideram a vida nas cidades pequenas como de melhor qualidade de vida do que numa cidade grande. De fato, numa cidade pequena vive-se uma vida bucólica onde podemos apreciar o canto dos pássaros, a apreciação da natureza em toda sua beleza, a alimentação natural com a colheita dos alimentos in loco. E depois há os barzinhos onde se pode beber com tranquilidade, as roças para se passar um fim de semana comendo e bebendo e se tiver um rio ou lagoa, nadar num banho refrescante.
Mas toda essa beleza tem um custo e ela se esvai quando somos confrontados com a necessidade de buscar os recursos para mantê-la. Há muito poucas possibilidades de se viver num emprego independente e bem remunerado, dentre eles o mais desejado que é um emprego de bancário. A atividade empresarial, de muitos riscos e de ganho incerto, é outra meta desejável. Contudo, os poucos recursos dos consumidores e a falta de mão de obra especializada são obstáculos intransponíveis.
Nas cidades pequenas todos se conhecem, consequentemente, seus pensamentos, suas poucas atividades, sobretudo, em quem você vota, são por todos conhecidos. Nesse aspecto, a vida torna-se muito limitada. Vida cultural inexiste; possibilidades de novos contatos e ascensão social também são quase nulos. As velhas oligarquias se perpetuam nos postos de mando barrando qualquer chance de ascensão de novas lideranças. Os jovens são proibidos de cultivar pensamentos e atitudes próprias e, sobretudo, de ter independência. Todos tem de assumir uma postura de submissão aos poderes constituídos se quiserem ter alguma chance de conseguir um emprego num órgão público, notadamente em prefeituras. Nestas se o candidato for contratado ou nomeado não terá direito a férias e décimo terceiro salário, sem contar que pode ser demitido a qualquer tempo, com ou sem justificativa. E isso nada tem a ver com competência.
Nós que somos pais, fazemos todos os sacrifícios para que nossos filhos estudem e consigam um diploma universitário. Isso porque queremos que eles se tornem independentes e bem remunerados. Mas há muitas formaturas que possibilitam a vinda para a terrinha natal: odontologia, enfermagem, medicina, engenharia civil e outras. Todavia, tem de se travar uma luta insana para que o exercício dessas atividades estejam fora do alcance dos políticos. Se estiver adeus independência; o voto já está encabrestado. Mas não se pense que só o voto é que é obrigatório; há a época das eleições quando se exige a presença em todas as carreatas, comícios, palestras, seminários e visitas as comunidades do interior do município. Nenhuma postura critica é tolerada. Nem mesmo dos filhos do funcionário que moram longe. Desse modo vai se perpetuando o atraso porque não há novas ideias em curso, não há nem mesmo disposição em tê-las.
Como disse o poeta polonês Czelaw Milosz falando sobre a ocupação russa na Polônia na Segunda Guerra Mundial: “A pressão de um Estado totalitário todo-poderoso cria a tensão emocional em seus cidadãos que determina os atos deles. Quando as pessoas são divididas em “leais” e “criminosas”, um premio é dado a qualquer tipo de conformista, covarde e servil, enquanto entre os “criminosos”, podemos encontrar uma porcentagem singularmente alta de pessoas discretas, sinceras e verdadeiras consigo mesmas. Do ponto de vista social, tais pessoas constituem a melhor garantia de que o futuro desenvolvimento do organismo social será em direção ao bem. Do ponto de vista cristão, não possuem nenhum outro pecado em sua consciência, a não ser desprezo pelo César ou a avaliação incorreta do poder deste.”
Como veem essas considerações podem ser transpostas ao regime imposto pelas prefeituras inseridas no Polígono das Secas.  E assim vai se perpetuando um sistema político arcaico e mesquinho,  fator determinante para o atraso secular em que vivem as cidades pequenas do interior nordestino.