sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Uma espécie ameaçada de extinção

Fala-se muito na conservação da área de preservação ambiental de Morro do Chapéu porque habitam ali espécies em vias de extinção. Não estou preocupado com isso, pois há uma outra espécie que também está ameaçada: refiro-me ao boca vazia. O boca vazia, coitado, não acha mais espaço hoje em dia para praticar o seu esporte favorito que é encher a pança com tira gosto grátis. Sinto informar, mas o Araguaia perdeu espaço e encanto. Primeiro foi dona Rosália que fechou a área atrás da trave do fundo, vizinha a Dega e que era onde Jarionei colocava sua barraca. Diz ela que Virgílio, esse desalmado, lhe fez a doação. Expulso de lá, Jarionei ocupou a área que era do falecido nego Nando. Ali era bom demais; debaixo de uma árvore frondosa, o banheiro no meio do mato, piriguetes para animar o ambiente, uma beleza! Mas aí a coisa foi ficando feia. Primeiro roçaram o mato quase eliminando o sanitário público. Felizmente ainda restara um matinho que ainda dava para esconder alguma coisa quando íamos fazer nossas necessidades fisiológicas. Nossas necessidades vírgula, verter água como se diz por aqui. Obrar? De jeito nenhum!
Depois o prefeito construiu dois lances de arquibancada, que foi uma coisa muito boa, diga-se de passagem, mas que escondeu o campo para quem estava na barraca do Jarionei. Mas aí bastava a gente ir lá ver o jogo e voltar no intervalo. Então aconteceu a tragédia: a ex-esposa do Toinho, irmão do prefeito, resolveu cercar a área com arame farpado, expulsando mais uma vez a barraca do Jarionei. Primeiro foi “dona” Rosália, depois a ex-esposa do Toinho, o que nos leva a concluir que as mulheres não tem nenhuma sensibilidade quando o assunto se refere à nossa diversão. Felizmente o campeonato já estava terminando e ainda deu para o Jarionei continuar com suas atividades até o fim. Fechado aquele espaço restou o quê? Uma nesga de terra em frente ao barzinho e as casas de um lado do Araguaia.
E agora? Para onde vai o nosso amigo Jarionei? E o boca vazia, coitado, onde saciar sua sede de cachaça com raiz e tira gosto? E os carros, aonde irão estacionar? Não tem jeito, só nos resta dizer adeus ao nosso velho, bom e querido Araguaia, palco de tantos e fartos rega bofes. Que saudade da feijoada sem calabreza e charque, do cuscuz feito numa bacia, do mocotó de currute, do Laurinho com seu terno de assistir missa,do Clóvis com sua risada escancarada, do Bira e sua preferência pela tripinha, do Jaime assando o úbere, do Dodô sempre trazendo coração de galinha para o deleite dos bocas vazias desamparados, do Valmir trazendo maçã para tira gosto, do Rocha soldado e seus correligionários do bar do Carlinhos, do Nem Queria e sua morenona sempre acompanhada da moreninha, do Fura Bica, legítimo representante dos bocas vazias e sua prosa ruim, do Zon sempre reclamando, dos políticos aparecendo em época de eleição (o Pedro Nilson e o Toinho do PT nunca apareceram por ali). Enfim, foi uma convivência que estreitou muitos laços de amizade e que agora chega ao fim.
Mas há uma luz no fim do túnel; o campinho preto. Basta ampliar mais o campo e temos um palco digno das pelejas mais memoráveis do Araguaia. Mato tem a vontade e com um cenário muito mais bonito por sinal, podendo-se escolher o local para “obrar” . Piriguetes a banda de lata e ampla área para estacionamento de carros. E agora o prefeito mandou construir dois vestiários e um barzinho como tem no Araguaia. O que está faltando? Um campeonato mais extenso e... a barraca do Jarionei, o patrono dos bocas vazias. Tudo nos trinques. O boca vazia que anda meio tristinho por falta de tira gosto no estômago, já tem uma esperança de dias melhores. O ano que vem vai ser de eleição e o nosso personagem, essa espécie ameaçada de extinção, vai ter garantido mais um ano de sobrevivência.